ESTA NEM PARECE DELE...
O PPM conclui, daí, que o então Ministro da Defesa fez muito bem em impedir, há um ano, a entrada de tal organização em águas territoriais portuguesas. Não consigo pereceber a relação...
Nunca fui de opinião de que valesse a pena discutir estes temas com pessoas esclarecidas. As suas opiniões sempre derivam de uma profunda reflexão e reflectem naturalmente as suas sensibilidades, mundividências e até convicções religiosas. Mas incomodo-me sempre com a demagagia, o excesso e o oportunismo.
Vamos por pontos.
1- A notícia da LUSA, como o PPM decerto já percebeu, além da não ser mais do que uma peça jornalistica é, também, uma peça jornalistica deficientemente traduzida. No original pode ler-se que a ausência de uma determinanda hormona aparenta, teoricamente, favorecer o desenvolvimento de uma bactéria letal quando alojada no útero.
2 - Não sou médica, nem cientista e não tenho a ousadia de discutir o rigor das conclusões de tal estudo. Tenho, no entanto, lido bastante sobre o assunto, e há muitas coisas que não desconheço.
3 - Em primeiro lugar, não é exacto que o medicamento em causa não seja comercializado em Portugal: ele existe e, apesar de não ser de venda livre, é habitualmente prescrito para úlceras gástricas. Um dos seus efeito colaterais é o de provocar fortes contracções uterinas, as quais, por sua vez impedem a produção de uma das hormonas que mantém o feto vivo.
4 - A sua capacidade abortiva indiscutivel tem a vantagem - segundo os médicos, e para os que não são contra o aborto - de dispensar, na grande maioria dos casos, intervenções cirurgicas mais ou menos complicadas, minorando-se assim os riscos que tais intervenções sempre acarretam.
5 - O seu principal risco - e de acordo com os estudos conhecidos - é o de não estar assegurada, sem vigilância médica adequada, a expulsão integral do feto e do restante conteúdo do útero. É a pernanencia intra-uterina das células mortas, em processo de decomposição, que tem sido atribuída a responsabilidade pelas septicémias mortais.
6 - Assim, nos estados americanos onde o aborto é livre, a utilização deste medicamento, embora dispense internamentos e cuidados médicos intensivos, não se dispensa de prescrição médica nem de vigilância e acompanhamento do processo abortivo.
7 - Pelo próprio estudo citado pelo PPM, ficámos a saber que em 5 anos quase meio milhão de mulheres usou este medicamento, e que 5 (sim, eu disse 5) vierem a morrer, aparentemente por causa da sua ingestão que, teoricamente, pode exponenciar uma infecção de que as mulheres já eram portadoras.
Falemos claro: o PPM tem todo o direito de ser contra o aborto, ou de achar repugnante a utilização de um comprimido que provoca a morte do feto e a sua explulsão, sem recurso a uma intervenção cirurgica. Vai ter é de concordar que este é o método mais seguro e eficaz de fazer um aborto. Logo, vai ter de pôr a questão onde ela se coloca: no problema em si e não no método.
E já agora, o PPM podia tranquilizar a minha militância: o Ministro da Defesa terá proibido a entrada do Born Diep por achar repugnante o uso de pílulas abortivas ou terá sido apenas um problema de legalidade? É que, tanto quanto constava dos comunicados oficiais, o fundamento de tal proibição radicava na defesa da ordem pública. Sendo a prática (activa e passiva) do aborto uma conduta criminalmente punida em Portugal, não vejo nada de estranho em um Estado de Direito impedir a entrada de alguém no seu território cujo único objectivo é desafiar o respectivo ordenamento jurídico. Já me pareceria muito estranho que um governante responsável actuasse de forma arbitrária ou discriminatória em nome de convicções pessoais, intransmissiveis e inoponíveis aos governados.
-FCP-