1. A rede de alta velocidade ferroviária tem sido um projecto quase consensual. Isso não impediu que o actual Governo tenha revisto este projecto. O novo projecto mantém a ambição de construir cinco novas linhas (quatro ibéricas) mas só fixa datas para as duas linhas consideradas prioritárias: Lisboa/Porto em 2015 e Lisboa/Madrid em 2013.
2. Segundo o Governo, o investimento neste projecto será de cerca de 8.3 mil milhões de euros. (TGV+3ª travessia sobre o Tejo).
3. No TGV, onde a exploração é muito importante para a rentabilização do avultado investimento, importa analisar com especial atenção o percurso e a sua capacidade de gerar externalidades positivas. A prioridade que era dada pelo anterior Governo ao percurso Lisboa/Porto/Vigo visava exactamente retirar da inserção territorial das linhas a sua maior rentabilidade. Favorecia uma ligação moderna e em velocidade elevada dos dois pólos mais importantes da fachada atlântica e promovia a coesão da zona onde se localizam a maioria da população e a maioria da actividade económica. A ligação transversal a Madrid era pensada em função da linha Lisboa/Porto/Vigo e da sua capacidade de gerar fluxos de passageiros e mercadorias. O principal instrumento de afirmação da competitividade de Portugal está na criação de um dinâmico “aglomerado urbano” (Lisboa/Porto e, tão cedo quanto possível, Setúbal/Braga). Para sermos competitivos à escala europeia temos que pôr os 7,5 milhões de pessoas deste “aglomerado urbano” a trabalhar conjuntamente. O TGV e o tempo por ele poupado têm que ser aproveitados produtivamente, como alavanca de progresso económico.
4. Os números divulgados permitem concluir que com o sistema em “T” deitado, o tráfego conjunto de Lisboa e Porto para Madrid sustentariam melhor a viabilidade da ligação à capital espanhola. O sistema em “L” agora apresentado levanta algumas dúvidas em relação à cobertura dos custos de exploração pelas receitas. Estas dúvidas ganham importância quando sabemos que há directivas europeias que impedem as ajudas do Estado ao transporte de longo curso (caso Sabena é exemplo). A pior decisão que se podia tomar é a de se construir uma infra-estrutura caríssima e depois não a poder aguentar.
5. A linha que se pretende construir entre Lisboa e Porto, em bitola europeia, terá um espaço canal totalmente novo. No entanto, é ainda desconhecida a forma como os comboios vão entrar nas duas cidades.
6. Relativamente à entrada em Lisboa, existem duas opções possíveis: uma pela margem esquerda do Tejo (a leste do rio) e outra pela margem direita (oeste do rio). Foi decidida a construção de uma 3ª travessia, para mercadorias e passageiros, rodo-ferroviária, sobre o rio Tejo, ligando o Barreiro a Lisboa. Esta ligação deverá possuir quatro vias: duas em bitola europeia e outras duas em bitola ibérica. Esta ligação resolverá diversos problemas: ligação para o Norte, Algarve, Alentejo, Espanha e uma nova via de suburbanos para a margem sul.
7. Para a 3ª travessia sobre o Tejo, entre Chelas e o Barreiro, (Rave diz que esta localização é inevitável) existem também duas opções: início na margem sul, junto ao terminal Fluvial do Barreiro, acabando em Chelas-Olaias, em linha recto, ou início no mesmo ponte e final na Gare do Oriente (ponte vista de cima faria um “S”).
8. Tendo em vista a ligação à Ota, a 1ª opção (Barreiro/Chelas-Olaias) implicaria a construção de um túnel de vários quilómetros, que passaria por baixo da Portela, circulando depois através de mais algumas dezenas de quilómetros de túneis e viadutos com pilares de alturas muito elevadas. O custo seria de vários milhares de milhões de euros, o que levará por certo ao abandono desta opção.
9. O grande problema da 2ª opção (Barreiro/Gare do Oriente) é a questão dos pendentes da ponte (uma vez que esta também será para mercadorias), levando a que a “descida” para a Gare do Oriente se inicie a uma distância muito elevada. A única justificação para a escolha desta estranha opção, que certamente iria desfigurar o estuário do Tejo, é servir a Ota, que se encontra a norte de Lisboa, e de a ligar aos portos de Setúbal e Sines, através das vias de bitola ibérica, uma vez que a Rave decidiu que a linha de bitola europeia Lisboa/Porto apenas seria para passageiros.
10. A opção pela construção de uma ponte com quatro vias, duas de bitola ibérica e duas de bitola europeia, é questionável porque a tendência é para o desaparecimento das linhas de bitola ibérica e Portugal pretende migrar todo o seu sistema ferroviário para bitola europeia. A utilização de bitolas telescópicas (já suficientemente desenvolvidas) resolveria a situação.
11. A indefinição relativamente a algumas das parcelas mais caras do projecto, como as entradas em Lisboa e no Porto, a localização das estações e a sua articulação com a rede convencional, bem como a forma como vão ser lançados os concursos e como vai ser desenhado o modelo de financiamento são, objectivamente um problema, quer para a avaliação do projecto em si mesmo, quer para a necessária captação de investimento privado. Os privados não sabem ainda “com que linhas se vão coser neste negócio”, onde serão chamados a intervir, quando e de que forma.
12. O sistema de partilha do risco e a possibilidade do modelo de financiamento do projecto de alta velocidade prever uma carga incomportável de desorçamentação, poderá transformar este projecto num caso parecido com o que está a ocorrer com as SCUT.
13. O impacto que o comboio de alta velocidade terá no transporte aéreo será de 30%, isto é, prevê-se que quase um terço dos passageiros dos aeroportos nacionais poderá vir a optar pelo TGV, em vez do avião, principalmente nas deslocações entre Lisboa e Madrid e entre Lisboa e o Porto.
14. O projecto de Alta Velocidade foi elaborado ao contrário: condicionou-se o desenho da rede de AV e VE à localização do aeroporto.
-ZPA-