A QUEDA DE UM MITO
Não pretendia escrever sobre Álvaro Cunhal. Tenho para mim que não devemos falar das pessoas de quem não gostamos na hora da sua morte. Não que não anote a convicção com que se dedicou à construção do seu projecto de sociedade. Ou a firmeza e a intransigência com que defendeu o seu ideal. Sucede que isso não me parece suficiente para enaltecer a sua figura ou para realçar o seu papel histórico.
Todas as personalidades que marcaram a história da humanidade se reconhecem pelos traços fortes do seu carácter (ou falta dele). Pelo seu carisma. Pela sua capacidade de suscitar nos outros uma intensa e acritica devoção. É sempre essa a massa de que são feitos os gandes líderes. Pois bem. Cunhal seria tudo isso. Mas felizmente, nisso não foi original.
É por isso que não creio que se justifique o feriado nacional. Ou funerais com honras de Estado. Não vejo por que há-de merecer o nome de uma rua numa cidade tão tradicionalmente liberal como é a do Porto.
Mas para ser franca, até nem é isso que me irrita. Irrita-me este maniqueísmo tão enraizado na cultura portuguesa que transforma as pessoas da esquerda em herois e as da direita em torcionárias. As qualidades pessoais e políticas de Cunhal não estavam ao serviço de uma boa causa. Nem são mais louvaveis só por serem dele.
A coragem, a convicção, a resistência ou a dedicação à causa pública não são património da esquerda. E apesar de serem sempre assinaláveis, nem sempre são exaltáveis. Tudo depende da bondade e da justeza da ideia e do propósito que veiculam.
Ora, o que Cunhal tinha na ideia não era nem justo nem bom. Ao contrário da sua propaganda, o seu projecto não era pelas pessoas, era contra elas. Foi por isso que, ao milhões, as pessoas o rejeitaram em todo o mundo.Não foi por gozar do rótulo - tão próprio das ideias da esquerda - de que traduzia uma bela utupia.
Que a liberdade e a democracia não deixem que a morte eternize uma mentira!
-FCP-
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